Mais recentemente ainda, surge outra ideia e iniciativa, a de um Coletivo, Laranja Violeta. Uma nova frente, portanto. O que é que o Coletivo permite a mais ou de diferente?
Um dos projetos mais recentes da MÔÇES é o “Artists & Fleas”. Um mercado que já tínhamos vontade de criar há algum tempo. Mas que por nãos, nãos, nãos constantes ainda não tinha sido algo... Se calhar também não era a altura certa, pronto. Foi a altura certa quando reunimos com o pessoal da Associação de Músicos (ARCM). E aí, em 2022, fizemos a primeira edição. Fizemos assim um scouting intensivo de artesãos e marcas locais, porque queríamos muito juntar esta comunidade algarvia de artesãos e produtores. E, de repente, criámos um evento incrível, que une de facto estas pessoas, mas também atrai curiosos e pessoas que eu não sabia onde é que elas estavam escondidas no Algarve. Ou, pelo menos, não as via quando saía à noite ou mesmo durante o dia. Não sabia que havia tantos jovens, jovens e não só, com esta vontade de se encontrarem, ou de terem este ponto de encontro onde pudessem trocar ideias, conversar, beber uma cerveja, ouvir música, comprar arte, expor a sua arte. E fazer um mercado um bocadinho diferente daquilo que estamos habituados aqui no Algarve – a típica feirinha, o mercado tradicional –, que acaba por não atrair este público jovem mais alternativo, que era exatamente o que nós, a nível pessoal, não tanto pela Associação, mas o que nós môçes queríamos encontrar, para também nos conectarmos a nível pessoal. Então o coletivo vem um bocadinho daí. Porque, de repente, vejo estes jovens a encontrarem-se num mercado. E foi no mercado que nasceu esta ideia do Coletivo, com outros vendedores e outras pessoas que o frequentavam. E foi: porque não criar um coletivo, onde de facto podemos juntar estas pessoas, mas não num mercado, e sim num evento com música, com arte? Ou seja, algo mais específico, onde também nos podemos reunir, e debater: como fazer isto? O que criar? O que explorar? Sem definir muito inicialmente, foi daqui que nasceu a ideia de unir estas pessoas. E foi engraçado que começou com um grupo completamente diferente, e depois foram entrando e saindo pessoas. Até chegarmos ao core, que é este grupo que agora se reúne semanalmente, e está a começar a criar estes eventos mensais. E que daqui eu não tenho dúvidas de que vá acontecer de facto revolução. E revolução no Algarve. E até me arrepio, porque imagina, em Lisboa e no Porto nós já temos isto a acontecer. Já eclodiu há muito mais tempo. E o Algarve é um livro em branco, uma página em branco, onde nós estamos a começar a escrever estes primeiros passos da revolução deste meio mais alternativo pelo menos, que existe muito pouco.
Para além disso, sabemos que és terapeuta transpessoal. E DJ em regime part-time. Também acabas por ser revolucionária ao entrares neste campo ainda muito dominado por homens. Quão livre é que te sentes nesta indústria? Já tiveste de enfrentar assim alguns desafios?
Sim. Não vou dizer que não tive de enfrentar alguns desafios, porque o ego humano é muito perigoso às vezes. É muito importante, mas também perigoso. E sim, por vezes, sente-se que há uma energia masculina que pode ficar afetada por uma mulher chegar-se à frente, e ter esta força de querer produzir e criar. E eu ainda estou no meu processo de desenvolvimento pessoal. Eu tenho muita energia masculina também. E isso pode chocar com muitos homens. Eu própria estou a tentar balançá-la com a minha energia feminina. Porque eu acredito que temos de ser um equilíbrio entre os dois. Mas eu própria também às vezes caio... Não sei se é errado ou certo. Mas posso cair nesta tendência de: eu quero fazer assim, e eu tenho razão, e eu vou à frente com tudo. E isso às vezes mexe com egos, sejam eles quais forem. Porque todas as mulheres também têm energia masculina. Então às vezes, esse pode ser o meu desafio interno. Não estou a dizer que é só uma questão externa. A terapia transpessoal ensina-me muito. Foi na pandemia que senti esta necessidade de olhar para dentro. E a terapia transpessoal veio através de uma amiga que já era terapeuta transpessoal. Decidi tirar o curso, e já acompanhei algumas pessoas. E é incrível como nós nos espelhamos tanto no outro. Então ter estas ferramentas, que sinto que são tão importantes, e que faltam a tantos nós, ajudam-me cada vez mais neste trabalho de juntar pessoas, e de como liderar de uma forma mais saudável. Porque já o fiz no passado. O meu trabalho sempre foi a produção, organização de eventos. Geri um centro cultural em Lisboa, que era um polo que movia muitas pessoas. Éramos uma equipa grande. E talvez não tenha sido uma liderança tão saudável assim. Daí, cá dentro também não estava tão feliz. Então vou tentando melhorar esses aspetos em mim, para depois cá para fora ser outra experiência.
Quanto ao DJing. Sou apaixonada por música desde sempre, em paralelo com esta vontade de unir pessoas e de produzir eventos. Unir pessoas, porque quando eu trabalhava como relações-públicas era muito isso. Eu gostava era de convidar as pessoas. Nem sempre eram os meus eventos, como é óbvio, inicialmente. Foi com catorze anos que comecei e não eram os meus eventos. Era mais: eu quero juntar estas pessoas. E ao mesmo tempo via aquilo como um trabalho. E era. Mas um trabalho em que eu me divertia também. Então a música sempre esteve presente. Nestes eventos, noite, festa. Seja o evento que for há sempre a música envolvida. Sempre tive muitos amigos na área da música, DJ’s, bandas e afins. E sempre houve este bichinho de também querer dar a outras pessoas esta minha seleção musical. Então em 2016, mais assim num tom de brincadeira, comecei a tocar com um amigo no Porto. Vivia no Porto nessa altura. Começou por ser uma festa. Depois formámos uma dupla. Começámos a tocar. Ainda tocámos de norte a sul, em vários sítios, festivais. Fomos tocar lá fora também. Depois fui de viagem. Ele vivia no Porto. Fizemos uma pausa. Depois voltei para o Algarve. E já era impossível estarmos os dois a tocar sempre juntos. Então comecei a tocar sozinha. E chamo-lhe um part-time, como chamo de part-time a todo o resto que eu faço. Porque, na verdade, eu não me consigo definir por uma profissão. Por isso chamo-lhe part-time. Porque eu não quero ser a “DJ”. Não quero esse rótulo. Como não quero o rótulo de “terapeuta”. Como não quero o rótulo de “produtora”. Não sei, às vezes para mim é difícil definir-me com uma coisa só. E ando nessa busca interna de conectar todas estas Marias diferentes, que fazem muitas coisas. E aceitar que posso ser tudo. E que me completo com isto tudo. Porque às vezes ainda tenho esta crença, lá está, dentro de mim: sou DJ, mas sou Terapeuta, será que os dois casam? Porque não? Então estou neste preciso momento da minha vida. Nessa busca interna. Nessa revolução interna de aceitar todas estas minhas partes.